quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Crónica do JN "Do Bolhão" de Helder Pacheco

 DO BOLHÃO

Em 23 de Janeiro de 1910, no Teatro Carlos Alberto, subiu o pano para a première da Revista “Às Armas”, de Arnaldo Leite e Carvalho Barbosa. A actriz Francisca Martins representava a Barbuda do Bolhão, popular regateira do Burgo e no quadro A Rainha dos Mercados, um estudante cantava-lhe: «A rainha do mercado / que fornece o Zé Povinho / vai fundar a dinastia / do presunto e do toucinho.» A seguir, a monarca definia o reino: «Sou rainha do chouriço, / minha coroa é o salpicão. / Os meus pagens são os nabos / e o meu nome é o Bolhão.» E após voltas e reviravoltas de deitar a casa abaixo a rir, rematava: «Sou rainha do mercado / o meu reino é o Bolhão, / a minha coroa é o nabo, / o meu ceptro um salpicão.»

Ainda o Bolhão não era o palácio de fazer compras e já se adivinhavam realezas eleitas pelo coração do povo. E, além de personagens que permaneceriam ao longo de um século no convívio portuense, o mercado constituiria o espaço sui generis onde decorria uma encenação colectiva que traçou o seu destino e prestígio.

Mas o sucesso do Bolhão, quando se transformou em ícone tripeiro, não foi consensual. A oposição conservadora ao projecto e à Câmara, além de apelidar o Presidente, Eng.º Xavier Esteves, como «homem do cimento armado», crismou o monumento recém-inaugurado como “Palácio do Repolho”.

De qualquer modo, o modernismo do Bolhão foi rapidamente apropriado pela cidade e nem agora, que ressurgiu da ruína e da decadência, essa relação se desvaneceu. Renasceu, revigorado na verdadeira modernidade, que significa conciliar passado e presente olhando o futuro. E mais nada.

Helder Pacheco


Enviado por Professora;

 Clementina Sobral Torres

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