quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

"Nocturno a duas vozes", Eugénio de Andrade

"Não é de medo
que tremem os meus lábios,
tremo por um fruto de lume
e solidão
que é todo o oiro dos teus olhos,
toda a luz
que meus dedos têm
para colher na noite.

Vê como brilha
a estrela da manhã,
como a terra
é só um cheiro de eucaliptos,
e um rumor de água
vem no vento.

Tu és a água, a terra, o vento,
a estrela da manhã és tu ainda.

Cala-te, as palavras doem.
Como dói um barco,
como dói um pássaro
ferido
no limiar do dia.
Amo-te.
Amo-te para que subas comigo
à mais alta torre,
para que tudo em ti
seja verão, dunas e mar."

Eugénio de Andrade,
in 'Poesia e Prosa 1940-198
(excerto do poema Nocturno a duas vozes)


Sem comentários:

Enviar um comentário